“Portal para o Mar: O mistério da visita de Cthulhu a Itacoatiara” é um thriller de detetive, ambientado em Niterói e inspirado na obra de H. P. Lovecraft. Foi lançado em novembro e, desde então, tem se mantido entre os dez primeiros livros no ranking de vendas da Amazon na categoria “Livros > Policial, Suspense e Mistério > Mistério > Investigadores Particulares”.
Talvez você nunca tenha ouvido falar em H. P. Lovecraft e, certamente, nunca ouviu falar em Empédocles Damásio, o Doc. O primeiro é um escritor que, em vida, alcançou pouca notoriedade e nenhum sucesso financeiro com seus contos, que misturam terror e ficção científica – um gênero que ele ajudou a inventar. O segundo é um relutante detetive particular (sim, esta é uma história de detetive) de Niterói, que quer apenas terminar sua faculdade de Direito, conseguir um emprego público e superar a perda precoce da esposa.
Lovecraft foi, ao que tudo indica, um homem atormentado pelas angústias de um mundo estranho, que ele viu surgir na virada para o século XX. Nele, o Universo se tornou vasto demais para ser compreendido, e o homem, mesquinho demais para ser idolatrado. A ciência o fascinou, mas suas descobertas, de tempos e distâncias incomensuráveis e de incertezas frias e definitivas, o assombraram. Então, ele sonhou (ou teve pesadelos) com Entidades Cósmicas adormecidas, indiferentes e destruidoras. Nada de alienígenas perversos que querem o nosso mal. Os Antigos, de Lovecraft, são forças incompreensíveis, que nos devorarão sem sequer tomar conhecimento de nós, apenas porque têm fome e estamos disponíveis.
Já Doc é alguém atormentado pela perda da Daniele, sua esposa, pela profissão, que detesta, pela falta de beleza no mundo. Suas angústias são as do século XXI. Ele está farto de investigar adultérios e está feliz com o seu primeiro caso diferente, um desaparecimento. Pagará caro por sua inocência. Sua vida e sua sanidade estarão em jogo, exatamente como um personagem do RPG “O Chamado de Cthulhu”.
Se o subtítulo deste livro, “O mistério da visita de Cthulhu a Itacoatiara”, não significa nada para você, não desanime. A obra de Lovecraft não é um requisito para a leitura deste livro (apesar de, provavelmente, ele ficar um pouco mais interessante para os familiarizados com seus textos). Da mesma forma, o desconhecimento das praias de Niterói não são impedimento. É esperança deste autor que, ao final da jornada, você conheça um pouco mais de ambos e talvez até se interesse em visitar Niterói e Lovecraft.
Mas não se engane, mesmo desconhecida do grande público, a obra de Lovecraft é influente. Os Mitos de Cthulhu formam um panteão de monstruosidades divinas e antigas que renderam muitos filmes ruins (que não mencionarei aqui, reservando-os para a crítica mordaz dos personagens). Mas eles estão também na música do Metallica, no controverso desenho animado South Park, em uma profusão de videogames e jogos de tabuleiro, e no Universo da DC Comics (Arkham, que dá nome ao famoso manicômio judiciário, é uma cidade ficcional, criada por HPL). O autor é fonte de inspiração para escritores como Stephen King, Neil Gaiman e Alan Moore, e diretores como John Carpenter e Guillermo Del Toro. O escritor argentino Jorge Luis Borges também escreveu um conto em sua homenagem: “Hay más cosas”. O título é uma alusão ao texto imortal de Shakespeare. Lovecraft, como Hamlet, também acreditava que existem coisas, no céu e na terra, que estão além de nossa compreensão.